COVID 19: Como funciona a responsabilidade em caso de força maior sob a ótica do Código de Defesa do
- Phillipe Fabrício de Mello e Sanny Fabbris
- 24 de mar. de 2020
- 4 min de leitura

Os contratos existem para serem cumpridos, isto não há discussão. Com isso, as cláusulas neles inseridas visam garantir o seu cumprimento, apoiadas, também, pelas legislações existentes, bem como a responsabilidade das partes em ressarcirem eventual dano causado a parte contrária, seja pela violação das próprias cláusulas do contrato ou por deveres jurídicos de natureza legal, propriamente dita, que nada mais é do que a violação da lei.
Nos contratos disciplinados pelo Código de Defesa do Consumidor, não é diferente. Os artigos 12 e 14, deste diploma legal, estabelece as responsabilidades contratuais e extracontratuais, ou seja, aquelas que estão previstas em contrato e as que não estão, em favor dos consumidores que são expostos ao risco de consumo, prevendo a chamada Teoria Objetiva para a responsabilização, que é aquela que independe da existência de culpa, aquela no sentido estrito de ato negligente, imprudente ou imperito, para que os danos causados sejam devidamente reparados, com exceção dos profissionais liberais, tais como os profissionais médicos, os quais dependem de culpa neste contexto.
Neste cenário, a pergunta que surge é: se ocorrer algo imprevisível que impossibilite o cumprimento e a própria finalidade do contato sujeito às disposições do Código de Defesa do Consumidor há responsabilização entre as partes?
A resposta é não. Isto porque há a exclusão de responsabilidade nos casos de casos fortuitos e força maior, impedindo a caracterização do chamado Dever de Indenizar, não sendo excluído o dever sobre eventuais perdas e danos, ou seja, a devolução de eventual valor pago pelo produto e/ou serviço.
Mas o que é, de fato, Caso Fortuito e Força Maior?
Ambos ocorrem quando ocorre um fato, cujos efeitos não eram possíveis evitar ou impedir, que impossibilite absolutamente o cumprimento do contrato e desde que não seja provocado pelas partes contratantes, no entanto Caso Fortuito se refere a um ato do ser humano, como por exemplo greves e guerras, e, de outro lado, a Força Maior que é um fato decorrente de forças da natureza, tais como raio ou tempestade.
É importante dizer que a excludente de responsabilidade em razão de Caso Fortuito ou Força Maior não está no Código de Defesa do Consumidor, mas sim no Código Civil, em seu artigo 393, o qual tem aplicação subsidiária, ou seja, em caso de não existir legislação especifica, se busca a lei perante o Código Civil. Assim está descrito o referido artigo:
Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado. Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos feitos não eram possíveis evitar ou impedir.
Como ilustração de como estes institutos são aplicados, o atual estado de calamidade pública, em decorrência da Pandemia do COVID-19, é um exemplo claro da excludente de responsabilidade para o cumprimento do contrato.
Diversos consumidores adquiram passagens aéreas, por exemplo, e não poderão embarcar, mas não por culpa das empresas aéreas, considerando que o fato era invencível, ou seja, não há outra forma de atingir o fim pretendido, no caso o embarque, tendo em vista que diversos países declararam situação emergencial e fecharam fronteiras e aeroportos, além dos inúmeros decretos que determinam a remarcação de viagens que não sejam em caráter emergencial.
Isto não quer dizer que as referidas passagens não devam ser remarcadas ou que o dinheiro pela compra destas não seja reembolsado, dependendo do interesse do consumidor, visto que o contrato de transporte aéreo está momentaneamente impossibilitado de ser cumprido.
A Medida Provisória nº 925, de 18 de março de 2020, a qual dispõe sobre medidas emergenciais para a aviação civil brasileira em razão da pandemia da COVID- 19, determina em seu artigo 3º, que o prazo para reembolso dos valores das passagens aéreas será de 12 (doze) meses e não haverá multa, em caso de aceitação de crédito, para utilização por igual período.
Art. 3º: O prazo para o reembolso do valor relativo à compra de passagens aéreas será de doze meses, observadas as regras do serviço contratado e mantida a assistência material, nos termos da regulamentação vigente. § 1º Os consumidores ficarão isentos das penalidades contratuais, por meio da aceitação de crédito para utilização no prazo de doze meses, contado da data do voo contratado. § 2º O disposto neste artigo aplica-se aos contratos de transporte aéreo firmados até 31 de dezembro de 2020.
No entanto, em caso de cobrança de taxas para a remarcação e/ou devolução de valores, entendemos que esta se mostra abusiva e pode ser objeto de discussão perante o Poder Judiciário, caso ocorra.
Não há, ainda, nenhum julgamento nos tribunais que trate sobre o tema ilustrado, aplicação da excludente de responsabilidade em razão do Coronavírus ou pela abusividade na cobrança de taxas para remarcação e/ou devolução de valores,
até porque é algo muito recente, mas certamente é algo que será visto nos próximos meses.
De qualquer forma, estar informado e consultar um advogado para saber quais atitudes podem ser tomadas e quais são os seus direitos, é a opção que melhor se adequa ao cenário atual, evitando-se prejuízos em conjunto com a razoabilidade.
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